sexta-feira, 23 de setembro de 2016

A Apologética e o humor


Uma definição simples e direta da palavra apologética é defesa, que implica em um primeiro momento numa resposta contra algum tipo de acusação ou denúncia. 

Nos séculos II e III da era cristã, a igreja se expandiu, ouve enorme crescimento, a cristandade chamou atenção de pensadores pagãos, que começaram a ataca-la, logo, alguns intelectuais de dentro da igreja começaram defender o Cristianismo destes ataques. Estes cristãos se destacaram na defesa da fé e foram considerados os primeiros apologistas.

Os principais apologistas da igreja são: Aristides, Flávio Justino, Taciano, Atenágoras, Clemente,Teofilo, Orígenes, Irineu, Tertuliano e Cipriano.

O desafio central destes primeiros apologistas era demonstrar que a religião cristã não era uma nova religião, e com isso afirmar que o cristianismo era o cumprir de profecias dadas por Deus aos profetas do Antigo Testamento.

No livro Apologética para glória de Deus, John Frame distingue a apologética em três: Apologética como prova, Apologética como defesa (A mais parecida com a dos primeiros apologistas) e Apologética como ofensiva. 

A primeira apresenta uma base racional para a fé, provando que o cristianismo é a religião verdadeira. A segunda responde de forma direta às objeções de descrentes. Já a última, ataca o pensamento ou cosmovisão dos descrentes e os sofismas que tentam se solidificar dentro da fé cristã. 

Um dos ícones da estratégia ofensiva apologética é o reformador Martinho Lutero. Num contexto onde a igreja estava inundada de negociações financeiras para obter de cargos eclesiásticos, venda de indulgência e acreditava na infalibilidade do Papa, Lutero atacou as doutrinas errôneas da igreja através das suas 95 teses, que foram afixadas na Igreja do Castelo de Wittenberg (31 de outubro de 1517).

Além das 95 teses que Lutero afixou na Igreja do Castelo de Wittenberg, Lutero desenvolveu uma forma de argumentar um tanto diferente. O Reformador criou charges que satirizavam os erros da igreja, algo que até aquele momento nunca ocorreu na história do cristianismo. Lutero usou o humor e ironia como uma ferramenta para conscientizar os fiéis das heresias que dominava o Papado e todo clero.

Alguns dos desenhos de Lutero eram torpes (estes devem ser rejeitados), pois continham nudez explicita, mas o desenho mais famoso dele o “Deuttung der cwo grewlichen Figuren” (Papa-Asno e o Monge-Bezerro), figura que assustava intencionalmente os fiéis, fazendo com que estes ficassem longe do Papado e dos Monges católicos, trazia também a ideia de que o Papa não tinha conhecimento da verdade (Papa-Asno) e os monges eram idolatrados pelo povo como o bezerro de ouro do Êxodo (Monge-Bezerro).




Alguns anos se passaram e hoje, na era digital, é possível observar este tipo de humor misturado com ironia dentro da defesa da fé. Claro, é ilícito levar este discurso humorístico que é ligado diretamente entretenimento ao púlpito, mas diferente do que muitos argumentam a Escritura não proíbe o uso do humor, muito menos proíbe a utilização do humor como ferramenta na defesa da fé.
Os que rejeitam o humor a todo custo fazem três principais objeções. 

A primeira é que o humor não é algo que deve misturar-se com a fé. A segunda é que o humor não faz parte da apologética. E por último, que é ilícito usar humor para defender a fé, pois a Escritura proíbe isso.

Dentro da cultura evangélica a maioria dos cristãos tem uma mente dividia entre sagrado e profano, fazendo uma leitura da realidade um tanto problemática. 

A partir dessa visão de mundo dúbia, o fiel acaba repudiando tudo que a cultura oferece, mesmo que a bíblia não classifique essa produção cultural como pecado.

Essa cosmovisão ofuscada por uma espécie de dicotomia acaba demonizando o uso do humor, que é automaticamente rejeitado pelos cristãos.

O que acaba norteando essa dicotomia não é a Escritura, mas aquilo que o líder ensina (Com base bíblica ou não). Como a maioria dos líderes evangélicos brasileiros não admira o humor e repudiam tudo que contém humor, ensinam os fiéis repudiarem tal manifestação cultural, logo, os fiéis seguem aquilo que está sendo ensinado, sem questionar. 

Influenciados pelo líder, e sem uma autocrítica, os fiéis concluem que todo tipo de humor é profano, e por consequência o humor não deve misturar-se com a fé.

Este grupo de evangélicos está equivocado, pois tudo que existe debaixo do céu é sagrado, pois foi criado por Deus (Gênesis 1.12, 21, 25), e algo só torna-se profano quando está inundado de pecado. Por este motivo temos que usar a Bíblia como regra, e julgar toda manifestação cultural, inclusive o humor, e classifica-lo como lícito ou ilícito.

Uma visão de mundo bíblica ensina que é preciso glorificar a Deus com todas as coisas (1 Coríntios 10:31 - Atos 10:15; Romanos 14:14), independente se aquilo é considerado secular ou não. É possível usar o humor para glória de Deus, claro, quando este humor não estiver debaixo de algo torpe (Efésios 4.29 - Colossenses 3.8 - Tito 2.2-8).

Já a segunda objeção afirma que humor não faz parte da apologética, e em um primeiro momento esse ponto é verdade, pois o leque apologético não pressupõe humor, mas isso não significa que o humor não possa ser usado como ferramenta para auxiliar a apologética.

É possível usar o humor como prova apologética, como defesa apologética e até mesmo de forma ofensiva na apologética.
O humor na apologética como prova tem como função auxiliar a reflexão do leitor a respeito da fé cristã, provando que o cristianismo é verdadeiro. Mas pode inclusive passear em outras áreas da teologia, como demonstrar que a doutrina bíblica deve ser somente extraída da Escritura, que existe um sistema moral absoluto criado por Deus e até mesmo ensinar sobre epistemologia.
Na apologética como defesa, o humor é uma ferramenta extremamente relevante, pois pode ridicularizar o ataque do oponente não cristão ou herege. Os ataques atuais que o humor defensivo advoga são falsas acusações contra a doutrina da predestinação, defesa da família tradicional bíblica e até mesmo questões de gênero.

Já na ofensiva apologética, o humor pode auxiliar atacando o pensamento estulto do incrédulo, falso profeta e falso cristão. Não somos chamados somente para responder indagações, pelo contrário, assim como os profetas do Antigo Testamento, os Apóstolos e o próprio Cristo deveram atacar os falsos ensinamentos anulando sofismas e toda altivez que se levante diante da verdade relevada na Escritura.

O terceiro ponto que tenta reprovar o uso do humor na apologética é um tanto legalista (criando leis humanas e tratando-as como leis de Deus), pois acaba criando um pressuposto além do que a Bíblia ensina.

A Escritura não proíbe o uso de humor na defesa da fé, inclusive, um dos principais profetas do Antigo Testamento utilizou humor para argumentar contra falsos profetas.

O texto bíblico onde o humor é utilizado por um profeta de Deus como uma ferramenta de apologética ofensiva se encontra em 1 Reis 18:27:


E sucedeu que ao meio-dia Elias zombava deles e dizia: Clamai em altas vozes, porque ele é um deus; pode ser que esteja falando, ou que tenha alguma coisa que fazer, ou que intente alguma viagem; talvez esteja dormindo, e despertará.

Neste contexto, o profeta Elias enfrentou de forma direta os falsos profetas de Baal, propondo um desafio. A disputa era para demonstrar se Baal ou o Deus de Israel era o verdadeiro. Foi separado dois novilhos, os falsos profetas de Baal deveriam pegar um dos novilhos, coloca-lo sobre a lenha e invocar Baal, para que fogo descesse do céu, e consumisse a lenha e o novilho. Elias faria o mesmo, mas invocaria o Deus de Israel. Se Baal fizesse descer fogo do céu e consumir o novilho, seria proclamado deus verdadeiro, se o Deus de Israel fizesse descer fogo do céu, seria anunciado como o Deus verdadeiro.

Os profetas de Baal clamavam ao seu deus desde a manhã até o meio-dia, e nada aconteceu. Então, Elias começou zombar deles. As zombarias de Elias eram parecidas com a que Lutero fez em relação ao Papado, eram sarcásticas e desdenhosas, inundadas de uma ironia que soava como enorme desprezo ao falso deus. 

Zombar de falsos deuses ou falsas doutrinas nunca foi censurado na Escritura. A ferramenta humorística que Elias utilizou foi eficaz, pois além de atacar um falso deus, expôs de forma clara a mentira idólatra dos profetas de Baal, além disso, após usar apologética com humor, Deus ouvia sua oração, e consumiu o altar com o bezerro. 

Se a forma com que Elias ironizou e zombou dos falsos profetas fosse considerado por Deus um pecado, dificilmente o Senhor iria responder a oração de Elias.

É evidente para o cristão que usa como bússola somente a Escritura que o humor pode ser utilizado como uma ferramenta relevante na defesa da fé, mas este humor nunca deve ser utilizado como um fim em si mesmo. Claro, não é lícito usar humor chulo e muito menos manusear de forma torpe textos bíblicos que ensinam a verdade, brincar com o nome de Deus ou com sacramentos, mas não é ilícito argumentar usando o humor contra falsos ensinamentos, contra mentiras teológicas, para reafirmar verdades bíblicas e até mesmo contra falsos profetas. 

Existe uma linha tênue que separa o bom uso do humor na apologética, em relação ao uso do humor como um fim em si mesmo, que é errado. Que possamos usar essa ferramenta criativa sempre para glória de Deus.


Higor Crisostomo

4 comentários:

  1. Olá Higor, estou estudando sobre teologia reformada, há menos de um ano, e tenho aprendido bastante. Sou assembleias, ainda, mas tem várias coisas que concordo, principalmente em relação ao calvinismo. Gostaria de saber sua opinião sobre o secamento do Rio Eufrates, estou pesquisando sobre dispensacionalismo. Obrigada. Ana Cunha.

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  2. "Zombar de falsos deuses ou falsas doutrinas nunca foi censurado na Escritura. A ferramenta humorística que Elias utilizou foi eficaz, pois além de atacar um falso deus, expôs de forma clara a mentira idólatra dos profetas de Baal, (...) "

    Curioso, zombar da religião alheia pode, mas quando se zomba ou critica a religião evangélica ou mesmo a cristã em geral,vocês ja começam a "chorar" dizendo que estão sendo perseguidos, que o Diabo ta usando as pessoas contra vocês, que a midia-satânica-Illuminati-comuna-gayzista quer destrui-los, que o outro está possuído... Pimenta nos olhos dos outros é refresco!

    E faltou dizer que Elias mandou matar os sacerdotes de Baal depois, não aconselho a cristãos tomarem esse cara como exemplo pros dias de hoje.

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  3. Eu prefiro ficar com paulo, paulo nao falou mal dos idolos quando foi pregar, ele falou sim que eram feito por maos e nao eram deuses, mas paulo nao zombou da religiao das outras pessoas, inclusive ele usou um altar do Deus desconhecido pra pregar. O exemplo para nós é paulo e nao elias

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